E se de repente nos apercebermos que as coisas já mudaram?
Sou filho único e vivi com os meus pais até aos 27 anos. Saí de casa, para uma nova fase da minha vida, há 31 meses e alguns dias (fiz agora as contas). Sempre tive com os meus pais uma relação que considero normal: saudável, presentes para as aflições, mas liberal e com espaço suficiente derivado dos interesses e gostos diferentes das duas gerações.
Quando saí de casa, começámos a falar e partilhar mais, mas por telefone. Foi uma espécie de fenómeno de compensação pelo tempo que já não estávamos juntos em silêncio a ver o Telejornal ou o futebol, a jantar antes de eu sair para os copos, ou a tomar o pequeno-almoço com os olhos cheios de remelas, antes de todos arrancarem para o trabalho.
Hoje, estão ambos reformados, a entrar na casa dos 60.
Nestes 31 meses, falei todos os dias com eles ao telefone e visito-os, pelo menos, uma vez por semana. 9 em cada 10 vezes, é a minha mãe que liga, sempre antes de eu me lembrar de o fazer. Hoje, já perto da meia-noite, lembrei-me que nem ela nem eu o tínhamos feito. Pego no telefone e vou para a janela fumar um cigarro.
«Então, tá tudo por aí?»
«Ai..... desculpa, filhote! Olha, tinha o telemóvel a carregar e nem me lembrei de te ligar».
2 minutos do diálogo do costume, nada de novo. Desligo e acabo de fumar o cigarro a pensar neste indicador. Sorrio, mas o sentimento é confuso. Hoje senti pela primeira vez que, naturalmente, começo a não fazer parte das suas rotinas.
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